ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | Possibilidades de análise sonora do silencioso A filha do advogado |
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Autor | Cauê Ueda |
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Resumo Expandido | É notória a afirmação de que "o cinema nunca foi silencioso", onde Jean-Claude Bernardet (1981) apoia-se em evidências da constante presença de aparato sonoro durante a exibição de filmes durante as primeiras fases da história do cinema, seja por música ou músicos, pela presença de atores atrás da tela ou pela cantoria dos próprios espectadores. Contudo, nos interessa validar o mesmo enunciado de forma diversa por meio da observação de elementos visuais que remetem a um estímulo aural, onde nem mesmo seja necessário o fenômeno físico para encontrar som onde parece não haver. Ainda que possamos partir da identificação das diferentes tipologias de som utilizadas no cinema atual, dentre voz, música e ruído (SONNENSCHEIN, 2001), notamos a carência de uma metodologia específica para a análise do som de títulos silenciosos (ALTMAN, 2004). Com grande parte da base literária dedicada à música utilizada nas projeções da época, bem como aos enfrentamentos tecnológicos até o estabelecimento do cinema sonoro, fez-se necessária a aglutinação de diversas experiências (BELTON, 1999; MANZANO, 2003; SZALOKY, 2002) para formar uma amálgama de procedimentos, que por sua vez poderiam indicar caminhos para resolver esta questão (ALVIM; CARREIRO, 2016). De forma propositiva, buscamos na técnica de "análise narrativa" e pela pergunta "o que ouço do que vejo" (CHION, 1994) uma forma preliminar de observação. Ainda que o contrário não seja cabível – "o que vejo do que ouço" –, podemos verificar para quais direções os vetores sonoros apontam intenções dramáticas e viabilizam a estruturação da narrativa, seja por meio de sugestões de som na imagem, do uso de cartelas ou das múltiplas coordenações na montagem, como o plano-refrão (CHION, 2009). Para nossa análise, trazemos A filha do advogado (Brasil, Jota Soares, 1926), um drama de costumes acerca do arranjo familiar em torno de Paulo. Prestes a partir para uma viagem à Europa, o advogado revela a Lucio, seu primo e confidente, que mantém em segredo uma filha longe da cidade. Ao mudar-se para Recife, Heloisa acaba por despertar o interesse do boêmio Helvecio, filho legítimo de Paulo, que não tem ideia de seu parentesco com a moça. Em uma espécie de emboscada, Helvecio tenta violentar Heloisa, que acaba atirando e matando seu meio-irmão. Em um atribulado julgamento, um misterioso advogado junta-se a Lucio, consegue o depoimento de Geroncio, criado de Heloisa, que confessa ter auxiliado Helvecio, inocentando a moça a título de legítima defesa. Para dar conta do complexo entrelaçamento das personagens de uma mesma família, oriundas de diferentes núcleos, podemos elencar as cartelas, que tratam dos diálogos e da narração, e as respectivas gesticulações que acompanham as falas como os principais expedientes para disposição das relações e dos acontecimentos. Ainda que neste caso o uso acentuado da pantomima se sobreponha à economia do recurso gráfico, mais direto pelo uso das palavras, é possível inferir que a voz é um importante elemento de distensão narrativa nesta fita, assinalando seu caráter vococentrado (CHION, 1994). Contudo a diegese não se limita às falas das personagens para promover seu andamento, recorrendo a outros eventos igualmente sonoros para disposição das situações, como a percepção do tiro desferido por Heloisa em Helvecio, que marca um ponto de virada na história. Junto ao ruído e à voz, a música está presente em dois momentos que dão maior dimensão às principais personagens. Ao passo que Helvecio festeja efusivamente ao som de uma banda que performa em um baile, Lucio repousa ao som da vitrola que toca em sua residência. Esses são alguns dos exemplos onde podemos verificar como situações sonoras são trazidas à tona por um registro exclusivamente realizado sob suporte visual. |
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Bibliografia | ALTMAN, R. Silent film sound. New York: Columbia University Press, 2004. |