ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | Transformações do cinema indígena na era avançada do vídeo digital |
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Autor | Ernesto de Carvalho |
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Resumo Expandido | Após 15 anos de engajamento, tenho entendido o cinema indígena como um conjunto de devires gestados em espaços interculturais de formação e experimentação conduzidos pelo desejo de auto-representação na experiência indígena contemporânea, e tenho me interessado em pensar o surgimento e as transformações desses espaços. É possível analisar a emergência o vigor do cinema indígena no Brasil sob diversos aspectos. Pode-se, por exemplo, associá-lo à relação histórica entre povos indígenas e a produção de imagens, e a forma como essa relação - geralmente traumática - se transformou ao longo do século XX, caminhando para a consolidação de uma posição de sujeito por parte de pessoas pertencentes a comunidades tradicionais que se recusam a continuar ocupando apenas a posição de objeto para imagens produzidas por outros. Em paralelo, é possível pensar, especificamente no Brasil, a lenta organização dos movimento indígenas no sentido da constituição de diversas formas de soberania, inclusive à que poderíamos chamar de soberania audiovisual. É também possível levar em consideração a emergência do "vídeo participativo”, fenômeno consolidado nos anos 90, como idéia que ganhou contornos específicos e especiais quando institucionalmente mobilizada por ONG’s indigenistas que se dedicaram à formação de realizadores indígenas, como é o caso reconhecido do Vídeo nas Aldeias. E é possível pensá-lo a partir das transformações e evoluções das próprias formas cinematográficas e da constituição de novas subjetividades no documentário e no cinema experimental, por exemplo. Em meio a tudo isso, finalmente, é possível pensá-lo pelo prisma das transformações tecnológicas e infraestruturais que levaram à popularização da tecnologia do vídeo nos anos 90, e como esta têm evoluído na era avançada do vídeo digital, da internet de alta velocidade e dos dispositivos móveis, e da subtração aguda de recursos sob o bolsonarismo. É principalmente sob esta última perspectiva, e na relação que isto tem com as formas e corporalidades específicas que o cinema indígena produz, que este trabalho se detém. Houve um período de intensa atividade de oficinas de vídeo conduzidas pelo Vídeo nas Aldeias, entre o fim dos anos 90 e meados dos anos 2010, no qual uma certa configuração se fez presente. Essa época foi marcada pelo uso de câmeras de vídeo dedicadas, de sensor pequeno, em oficinas de duração de três semanas a um mês, focadas na produção de conteúdos para visionagem coletiva e subsequente montagem em filmes que podem ser situados dentro da tradição do cinema direto de documentário. Estas oficinas contavam com uma etapa separada, dedicada à montagem. Havia algum financiamento de instituições internacionais, e também de órgãos governamentais, como o ministério da cultura do Brasil. Esse momento, marcado pela emergência de formas, de corporalidades imagéticas, e de arranjos institucionais específicos, foi sentido por pessoas que nele participaram como “o cinema indígena”, e não como que agora parece ser uma configuração bastante contingente, momentânea na evolução desse campo. A contingência desse momento se revela com força no presente, ao tentar voltar a conduzir atividades em meio às condições adversas atuais. Perguntas são feitas que desnaturalizam por completo a forma como essas atividades eram conduzidas. A análise contida neste trabalho é feita a partir de uma apreciação etnográfica desse campo, a partir de um posicionamento específico - de oficineiro-antropólogo - que implica ao mesmo tempo um perspectiva colada ao fenômeno, porém com um esforço de desnaturalização constante. O que interessam são as modulações pedagógicas técno-corpóreas do cinema indígena e participativo. Que impacto têm a introdução das novas tecnologias nesse contexto? Que transformações são sentidas no contexto da montagem a partir da disseminação de celulares? Como funciona uma oficina de vídeo na era do drone? |
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Bibliografia | Carelli, Vincent, Mari Correa, and Jean Claude Bernadet |