ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | Capitu: uma estética pictórico-sensorial na adaptação para a TV |
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Autor | Carolina Soares Pires |
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Resumo Expandido | O trabalho de Luiz Fernando Carvalho caracteriza-se pelo elaborado amálgama de diferentes artes que o diretor cria em suas obras. Sua particular imbricação das linguagens do cinema, teatro, ópera, dança, artes plásticas e literatura, faz da obra de Carvalho algo sui generis – especialmente em um contexto de televisão brasileira . Carvalho trabalha na fronteira entre diferentes formas artísticas, incorporando elementos das várias artes, o que coloca suas obras num ponto de intersecção. O resultado final carrega em si essa multiplicidade de referências: assistir a uma obra de Carvalho remete a assistir a uma peça ou a ver um quadro pintado. Em última instância, a obra televisiva de Luiz Fernando, sobretudo a microssérie Capitu, realiza-se pela fusão de linguagens e pela proliferação de referências. A combinação de dança, música, cenário, arte, cinematografia, mise-en-scène, entre outros elementos, expressa o estado psicológico e emocional do narrador-personagem e estabelece o mundo ficcional como extensão deles. A justaposição de elementos de variadas linguagens artísticas culmina em sequências altamente sensoriais e poéticas, intercaladas por sequências em que predomina a função narrativa. Capitu não se apresenta como verdade e, sim, como lugar da representação. O lugar da representação é também o espaço da memória, no qual será feita uma incursão pela memória de Bento, ou Dom Casmurro, adentrando sua subjetividade. O narrador, que encarna o narrador em primeira pessoa do romance, materializa-se no campo da imagem e narra sua história para a câmera, num cenário operístico, inspirado em El Greco e Caravaggio. Esse narrador, ao invocar suas memórias, as vê também materializadas e passa a ser espectador da história que ele mesmo relata. Carvalho segue um caminho anti-realista, em que a memória é uma memória-presença. Passado e presente convergem, deformando o espaço-tempo realista, formando um outro espaço de interação, realizando – fisicamente – o desejo de Dom Casmurro de "atar as duas pontas da vida" (as mãos do Bento-narrador e do Bentinho adolescente se unem, atando-se os dois corpos). A mise-en-scène de Capitu funciona nessa dinâmica de corpos do "presente" e do "passado" habitando o mesmo espaço. Essa corporeidade advinda da presença física dos atores é muito bem aproveitada e explorada por Carvalho, que não só cria uma atmosfera um tanto onírica, aproximando-se da experiência subconsciente do sujeito ao lembrar e rememorar, como também expressa a subjetividade e a não-confiabilidade do relato e do narrador por meio de sua presença física ou presumida (sombras, voz, contraplano). Nas sequências poéticas, a câmera tende a buscar texturas, abstrações imagéticas, a materialidade dos espaços físicos. A composição dessas imagens é quase pictórica, com a mise-en-scène funcionando em uma dinâmica que serve ao duplo propósito pictórico e sensorial. A composição da imagem se faz em uma lógica pictórica, não só por aproximações com quadros e movimentos artísticos, mas pela própria natureza do gesto de criação das imagens, que se configura como um gesto pictórico. Jacques Aumont, em O olho interminável investiga a relação entre cinema e pintura não só a partir de similaridades plásticas ou referências imagéticas, mas considerando a evolução histórica do olhar nascido na pintura e que chega até o cinema, com seu aparato tecnológico e desenvolvimento do movimento. É notória essa relação em Capitu, a imagem cinematográfica figura como prolongamento, evolução da imagem pictórica. essas sequências poéticas suspendem temporariamente a narração, para expressar as sensações das personagens. O tempo dilata-se ou acelera, numa modulação guiada pela sensação e se torna parte estrutural da estética pictórico-sensorial em Capitu. Como essa plasticidade e sua construção através da direção de fotografia e outros elementos visuais contribuem para a geração de sentidos nessa obra, tanto em si própria, quanto no diálogo com o romance? |
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Bibliografia | AUMONT, Jacques. A estética do filme. Campinas, SP: Papirus, 2011. |