ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | Estilo e música em filmes de Nuri Bilge Ceylan: parcimônia e repetição |
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Autor | Luíza Beatriz Amorim Melo Alvim |
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Resumo Expandido | Este trabalho faz parte do projeto de pós-doutorado em que pesquisamos a presença da música preexistente do repertório clássico em filmes autorais contemporâneos, partindo das seleções dos festivais de Cannes, Berlin e Veneza. Após um mapeamento geral, fazemos uma análise mais detalhada dos filmes encontrados, associando os achados à obra dos cineastas como um todo. Embora o repertório clássico seja mais frequente em filmes contemporâneos europeus em geral, percebemos sua presença constante em alguns diretores-autores de regiões de outras tradições culturais e/ou religiosas, como na cinematografia do sul-coreano Hong Sang-soo, apresentada na Socine 2022. Observamos uma prevalência ainda maior na cinematografia do turco Nuri Bilge Ceylan e é importante observar que todos os filmes dele passaram nos citados festivais europeus. Desde seu primeiro curta-metragem, Koza (1995), Ceylan utiliza música clássica ocidental, principalmente do compositor J. S. Bach, também presente em três outros filmes, incluindo o mais recente. Conforme o conceito de Gorbman (2007) de “música de autor”, Ceylan tem grande controle de suas escolhas musicais nos filmes. Em entrevista, afirmou seu gosto por Bach e reclamou da “imposição do Ocidente” de que países do dito Terceiro Mundo tenham que usar música local, ao passo em que a música clássica pertenceria a todos. Ceylan também admitiu que, por vezes, prefereria não usar música nenhuma, o que o aproxima bastante da postura e do estilo do cineasta francês Robert Bresson. De fato, várias outras características aproximam os estilos dos dois diretores: a parcimônia com que a música é utilizada e, no caso dos dois últimos filmes, a repetição do mesmo trecho musical (ou com variações), pontuando vários momentos do filme. Além disso, tanto Ceylan quanto Bresson são admiradores e se valeram da Literatura Russa. Sono de inverno (2014), por exemplo, é inspirado em três obras de Tchekov e podemos encontrar temas do escritor em toda a obra de Ceylan. Conforme discute Elsaesser (2005), por vezes, parece haver mais em comum entre diretores autorais de países distantes do que entre cada um deles e seus respectivos cinemas nacionais, pois há um repertório estilístico compartilhado no assim chamado “cinema de arte” internacional, regido, em parte, pelo circuito dos grandes festivais internacionais e o mercado de distribuição que eles movimentam. Associado ao slow cinema, com personagens que falam pouco, em Sono de inverno, Ceylan dá uma guinada verborrágica. Embora tanto este quanto A árvore dos frutos selvagens (2018) sejam os seus filmes mais longos, com mais de três horas de duração, são preenchidos com diálogos longos, em que os personagens se atacam por meio do que falam, numa batalha de palavras ao modo de Dostoievski. Ainda assim, entre cada batalha travada, há momentos contemplativos/ou de deslocamentos, e é neles que Ceylan coloca pequenos trechos do mesmo tema musical. Em Sono de inverno, há 11 incursões do tema do Andantino da Sonata para piano D959 de Schubert – mesma obra presente em A grande testemunha (1966), de Bresson –, tendo sido utilizadas variações do tema encontradas na própria música. Em nossa análise, discordamos de Hart (2019), no sentido de que, apesar de se associar fundamentalmente ao protagonista masculino, a música também é ouvida na imagem da mulher dele justamente após um diálogo e momento climático. Tal compartilhamento da música entre homem e mulher já acontecia com a sonata de Scarlatti em Climas (2006), primeiro roteiro do diretor escrito junto com a esposa. Em A árvore dos frutos selvagens, ouvimos a Passaglia e Fuga em dó menor BWV 582, de Bach, em 10 incursões, em sua maioria, na versão orquestral da obra. Aqui, a música é essencialmente ligada ao protagonista, um aspirante a escritor. Apresentamos os resultados da análise fílmica desses dois filmes de Ceylan que apontam para o seu estilo, considerando também aspectos culturais e questões de autorismo no cinema contemporâneo. |
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Bibliografia | ÇAGLAYAN, Emre. Nuri Bilge Ceylan: An Aesthetics of Boredom. In: Poetics of Slow Cinema: Nostalgia, Absurdism, Boredom. Palgrave Macmillan: 2018. |