ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | Ressujeitando o cinema: o ato de criação queer em Bixa Travesty |
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Autor | Daniel Oliveira Silva |
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Resumo Expandido | Pensar em um cinema queer é refletir sobre como o audiovisual, com suas estratégias estético-narrativas, pode contribuir para uma proposta antinormativa de gênero e sexualidade. Partindo da noção de que uma série de filmes contemporâneos tem concretizado esse propósito por meio da encenação de um ato de criação queer (SILVA, 2021), esta comunicação busca identificar esse ato na performance estético-político-corporal da multiartista Linn da Quebrada no longa Bixa Travesty. Associando um trabalho de análise fílmica à metodologia proposta pela Teoria dos Cineastas, pretende-se investigar como o gesto de autofabulação executado por Linn no filme – no seu discurso, no seu corpo e, especialmente, no olhar que ela dirige diretamente à câmera – opera uma in/subversão não apenas da tradicional relação sujeito/objeto no documentário, mas da própria tradição de objetificação do corpo trans e do corpo negro pelo cinema. Por meio de suas palavras e de sua performance, ela estabelece um diálogo de coautoria com a dupla de realizadores que coloca esse corpo trans, assim como a periferia historicamente marginalizada pelo audiovisual, no lugar de sujeito da narrativa. Segundo Halberstam (2005, p. 6), queer se refere a uma série de “lógicas e organizações não-normativas de comunidade, identidade sexual, corporificação e atividade no espaço e tempo” . Para o teórico, a especificidade das experiências de mundo e das histórias de vida dos sujeitos não-heterossexuais implica em percepções e construções diferentes de espaço e tempo, instaurando novas formas de ser e estar para essas pessoas. Nessa perspectiva, a arte passa a ser menos um meio de expressão de identidades/subjetividades e mais uma ferramenta num cenário de disputa de narrativas: entre um projeto heterossexista e normatizante e outro, disruptor e antinormativo. Ela se torna mais uma forma de imaginar e conceber essas novas lógicas de espaço e tempo, fora do discurso e dos parâmetros heteronormativos. Trata-se de desestabilizar não apenas o palco, a página ou a tela, mas de reimaginar a casa, a escola, a periferia, o casamento, o passado, o futuro, a partir de experiências não-normativas. Desse modo, se a narrativa heterossexista historicamente associou a periferia a um lugar de violência e insegurança homo e transfóbica, o corpo de Linn da Quebrada reocupa esse espaço e inverte essa lógica com sua performance, tornando-se “não somente um lugar de poder, mas, sobretudo, o espaço de uma criação na qual se sucedem e se justapõem os movimentos feministas, homossexuais, transexuais, intersexuais, transgêneros, chicanas, pós-coloniais” (PRECIADO, 2011, p. 14). Porque, nessa lógica “sexopolítica, […] o corpo não é um dado passivo sobre o qual age o biopoder, mas antes a potência mesma que torna possível a incorporação prostética dos gêneros” (PRECIADO, 2011, p. 14). Assim, logo na sequência inicial do documentário analisado, a cantora se projeta, por meio da sua autodesignação que dá nome ao filme, Bixa Travesty, nas casas e prédios da periferia paulistana, afirmando-se desde o princípio como agente operadora da máquina cinematográfica, representada pelo mecanismo de projeção e luz – leia-se, como sujeito da (meta)linguagem audiovisual que usa o cinema para ocupar e queerizar aqueles espaços. Nessa disputa de narrativas, portanto, o artista, sua obra, sua performance e seu corpo não são meras vítimas de opressão ou censura, mas agentes de um trabalho de “desterritorialização da heterossexualidade, que afeta tanto o espaço urbano (é preciso, então, falar de desterritorialização do espaço majoritário, e não do gueto) quanto o espaço corporal” (PRECIADO, 2011, p. 14), fazendo uso de estratégias que não cabem mais nos sistemas e lógicas artístico-criativos tradicionais, que passam a ser questionados, subvertidos e reinventados, resultando em novas formas de autoria, de performance, de ocupar o palco e o enquadramento da câmera. |
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Bibliografia | HALBERSTAM, J. In a Queer Time and Place: transgender bodies, subcultural lives. New York University Press, 2005. |