ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | A face silenciada atrás de Shoah (Claude Lanzmann) |
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Autor | RAFAEL TASSI TEIXEIRA |
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Resumo Expandido | Edificada em torno a alguns paradigmas que passaram a ser estruturantes na abordagem artística e cinematográfica sobre o Holocausto e os campos de morte, a obra canônica de Claude Lanzmann Shoah (Claude Lanzmann; 1985), consegue, sob signo da ‘catástrofe’ (SELIGMAN-SILVA, 2000), disseminar uma perspectiva que será predominante, e amplamente difundida, no exercício de possibilidades representacionais posteriores sobre a história das vítimas do Holocausto. A sacralização dos rostos masculinos e os depoimentos de vítimas e algozes masculinos no filme de Lanzmann, tal como reflete Mariane Hirsch (2012), será a forma preferencial de veiculação imagística e inscrição de memória nos estudos da Shoah, da mesma maneira que nos caminhos ético-estéticos em relação ao tema no campo do cinema. Nesse sentido, o trabalho aqui proposto busca seguir a senda do filme de Catherine Hebert, Ziva Postec, La monteuse derrière le film Shoah (Catherine Hébert, 2018), que apresenta o trabalho da montadora Ziva Postec, figura essencial no filme de Lanzmann, e apagada da historiografia (pelo próprio cineasta, pela cultura da memória masculina da Shoah). O filme de Hébert, estruturado a partir de depoimentos da cineasta e montadora, detalha os procedimentos criativos e a importância da artista na organização do material de mais de 350 horas de entrevistas, além do apagamento perpetrado pelo próprio Lanzmann, quem despediu Postec depois da estreia do filme. Em uma torção epistêmica dos estudos dos testemunhos, conforme estrutura o debate Seligmann-Silva (2022), e com especial atenção à perspectiva das representações sensíveis entre cinema e genocídio (ZYLBERMAN, 2022), o trabalho aqui proposto pretende discutir as ‘viradas testemunhais e decoloniais do saber histórico’ em relação ao filme de Lanzmann, sua figura como demiurgo imposta dentro do tema na história do cinema mundial, e sua hegemonia performativa e narratológica no repertório estético-conceitual da Shoah. Nessa perspectiva, que não é inédita (ROLLET, 2019; ROUTHBERG, 2000), mas que pretende reivindicar uma historiografia a contrapelo incidindo na memória audiovisual da Shoah, a localização de corpos, imagens e testemunhos de artistas segregadas pelo telos ocidental e sua lógica falogocêntrica em relação ao tema, mostra como a cultura do encobrimento precisa ser de modo urgente reprendida pela ocupação de memória – em novas sensibilidades pós-coloniais. Além disso, o trabalho também busca correlacionar e evidenciar a proposta contra hegemônica do filme de Hébert com o que pode ser observado nos arquivos audiovisuais de testemunhos de vítimas mulheres do Holocausto, em materiais pertencentes ao acervo técnico do Museu do Holocausto de Curitiba gravados em VHS na primeira metade da década de 1990, por incentivo da Shoah Foundation. Tais arquivos, que fazem parte do projeto de pesquisa deste pesquisador em um convênio com o Museu do Holocausto, exemplificam essa discrepância entre a evidenciação de rostos masculinos sobre a Shoah e a história dos testemunhos do Holocausto. No trabalho aqui proposto, pretendemos apresentar esse contingenciamento histórico e paradigmático da história audiovisual da Shoah à luz dos estudos decoloniais e memorialísticos, buscando redefinir e esgarçar outras enunciações, outros paralelos e forças subjetivantes para colocar em comemoração (LÉVINAS, 2010) a inscrição de memórias obliteradas nos discursos dos eventos-limites. |
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Bibliografia | HIRSH, Marianne. The Generation of Postmemory. Writing and Visual Culture After the Holocaust. Columbia University Press, 2012. |