ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | Uyra Sodoma: narrativa transmídia e transgênero sobre o fim do mundo |
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Autor | MARCOS PAULO SOUZA CORRÊA |
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Resumo Expandido | O presente trabalho fundamenta-se nos conceitos de narrativa transmídia (JENKINS, 2008) e performance (FISCHER-LICHTE, 2009) a fim de investigar como a temática do “fim do mundo” é abordada no projeto transmídia multiplataforma Manaus, uma cidade na aldeia, da artista Uyra Sodoma. Também estabelecemos relação da temática presente no projeto transmídia com autores (DANOWSKI; VIVEIROS DE CASTRO, 2014; KRENAK, 2019, 2020; LEAL, 2021). Em abril de 2020, a educadora e artista visual transgênero indígena Uyra Sodoma realizou a performance Manaus, uma cidade na aldeia, nas ruas da capital do Amazonas. Em dezembro do mesmo ano, a performance foi divulgada como videoperformance no site do Instituto Moreira Salles, nas plataformas Vimeo, Youtube e nas redes sociais Instagram e Facebook, tornando-se, assim, um projeto transmídia multiplataforma. Na narração presente na videoperformance evidencia-se o posicionamento crítico de Sodoma em relação ao modelo de desenvolvimento da cidade de Manaus, que seguiu padrões europeus, em detrimento dos valores e ideais indígenas. A videoperformance dialoga com o momento de caos sanitário e morte da população indígena durante a pandemia de Covid-19. Sodoma também associa o grande número de mortes causados pelo vírus ao período de colonização, no século XVI, e corrobora para a ideia de resistência dos povos indígenas e “fim do mundo” para esses povos. Débora Danowski e Eduardo Viveiros de Castro (2014), evidenciam que a perspectiva de “fim do mundo” faz parte de um pensamento da virada da antropologia ocidental para um declínio (DANOWSKI; VIVEIROS DE CASTRO, 2014. p. 18), embasado em uma fabulação mítica que hoje faz parte do imaginário da cultura mundializada. Dodi Leal (2021) destaca a notoriedade dos pensamentos que tratam do “fim do mundo” e grande vendabilidade que tais ideias ganharam durante o período da pandemia do coronavírus em 2020. Para a autora “a comercialização do fim somou-se a uma commoditização das sabenças não-hegemônicas” (LEAL, 2021, p.2). Ou seja, o fim apregoado pela mídia tornou-se uma narrativa vendável e estimulou a cultura do desespero. Krenak (2021), por sua vez, questiona a noção de humanidade da sociedade contemporânea para evidenciar o desenvolvimento dos grandes centros urbanos e a modernização das cidades. Para o autor, existe a humanidade – homens brancos e populações dos grandes centros urbanos – e o que classifica, em tom crítico, de sub-humanidade –caiçaras, índios, quilombolas e aborígenes. Krenak (2021, p.15) também destaca que apesar das ameaças políticas sofridas pelos povos originários, preocupa-se ainda mais com o homem branco. O pensamento articula-se à narração de Sodoma na videoperformance Manaus, uma cidade na aldeia: “A Amazônia primitiva: nos traços que se vê: indígena e preta, segue andando, se transformando, se apropriando, retomando". Nossa análise em torno da temática do “fim do mundo”, de Manaus, uma cidade na aldeia, em diálogo com os autores citados, nos leva a quatro considerações: a primeira é a de que a espetacularização em torno do “fim do mundo” direciona a um pensamento de fim futuro (LEAL, 2021, p.17), marcado pelo fim de um projeto colonial de ser humano, de gênero e de mundo. A segunda é a de que para muitos povos ameríndios a destruição do mundo atual é algo iminente e um projeto já iniciado (DANOWSKI; VIVEIROS DE CASTRO, 2014. p. 105) desde a colonização brasileira, no século XVI. A terceira consideração revela as diferentes perspectivas de mundo (e fim dele): se para o homem branco as florestas são vazias, para os indígenas, estão cheias de espíritos e ancestrais (KOPENAWA; ALBERT, 2019. p.118). A última consideração se relaciona uma perspectiva não de fim do mundo, mas de novo mundo constituído por uma nova humanidade, marcada por uma população que necessita crer em mundo que deveria ser criado a partir do mundo que foi deixado. (DANOWSKI; VIVEIROS DE CASTRO, 2014. p. 159). |
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Bibliografia | DANOWSKI, Déborah; VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. Há mundo por vir? Ensaio sobre os medos e os fins. Desterro (Florianópolis): Cultura e Barbárie; Instituto Socioambiental, 2014. |