ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | Ana Carolina à luz do manifesto: uma proposta de análise fílmica |
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Autor | Renata Masini Hein |
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Resumo Expandido | O manifesto, enquanto gênero do discurso, apresenta como característica fundamental a experiência de ruptura. Produzido pela necessidade de intervenção a partir da urgência de uma luta pública, o manifesto tem como principais especificidades formais, segundo Gelado (2016): a brevidade e o cariz performático do discurso; a polêmica; “o meio privilegiado de ataque ao fenômeno da arte no seio da sociedade burguesa” (p. 39), buscando a desautomatização na recepção da obra de arte; “o amálgama de projetos filosófico, político e estético: o desejo de instaurar uma nova vida, alterar a ordem social e praticar novas formas de arte" (p.41) e “o tratamento maniqueísta da temporalidade, estreitamente relacionado com a noção do novo como absoluto" (p. 41). Traz, como meios de linguagem importantes, a presença de um título que funcione como síntese; o tom predominante de agressão e a estruturação por base em enumeração, fragmentação, asserção negativa, excesso, violência verbal e estética, humor irônico, tendência à hipérbole, paradoxo e grito. Com linguagem disruptiva e alegórica, a trilogia “Mar de Rosas” (1977), "Das Tripas Coração" (1982) e "Sonho de Valsa" (1987) de Ana Carolina escancara a violência de uma sociedade patriarcal, autoritária e capitalista. As personagens mulheres, todas racializadas como brancas e de classe média, se situam sempre no limite, na iminência da loucura e da aflição, seja ao vivenciarem relações conjugais abusivas, ao buscarem a superação das figuras materna e paterna, ao explorarem a sexualidade em um ambiente conservador e ao se esforçarem ao máximo para conquistar o amor romântico. Em suas relações inter-pessoais, vivem inúmeros abusos de poder, coerções, desaprovações morais e constrangimentos justamente por serem mulheres, a ponto de sobrar apenas o desejo - até meio anárquico - de explodir tudo. Inseridos em um momento histórico marcado por acaloradas discussões e por grandes mobilizações feministas - período consagrado pela historiografia como Segunda Onda do Feminismo, a qual tinha como slogan “o pessoal é político” exatamente por desnaturalizar as ligações entre casa e trabalho, produção e reprodução, sexualidade e família - bem como de luta pelo fim da ditadura empresarial-militar e pela redemocratização, os filmes, por meio do caos narrativo, do tom agressivo, da falta de verossimilhança e da disposição ao exagero, à ironia e à polêmica, tensionam, levando ao extremo, a violência - e até o doentio - de um Brasil autoritário e patriarcal. Dessa forma, a filmografia não apenas se relaciona com características do manifesto como gênero discursivo, mas é o próprio gênero discursivo manifesto que pode possibilitar uma potente forma de entrada nos filmes para, a partir daí, compreendê-los em suas dimensões tanto estéticas e narrativas quanto históricas e políticas. Ao expressarem as diversas opressões e contradições do período histórico no qual estão inseridos, os filmes se posicionam frente ao debate público, questionando os próprios limites entre a arte e a vida. |
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Bibliografia | BORTULUCCE, V. B. O manifesto como poética da modernidade. Literatura e Sociedade, [S. l.], v. 20, n. 21, p. 5-17, 2015. DOI: 10.11606/issn.2237-1184.v0i21p5-17. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/ls/article/view/114486. Acesso em: 17 abr. 2023. |