ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | Fantasmas, memória e vingança: um estudo do folk horror brasileiro |
|
Autor | Juliana Monteiro |
|
Resumo Expandido | O cinema de horror é marcado por uma enorme diversidade de convenções, terrenos e estilos. Brigid Cherry, autora do livro Horror, considera o horror como um termo genérico, que engloba várias subseções unidas pela sua capacidade de horrorizar; como uma coleção de categorias relacionadas, porém, muitas vezes, dispares entre si (2009, p.3). Algumas dessas histórias transportam o horror para a região rural e compartilham os perigos do isolamento cercados por figuras de moralidade questionável. O subgênero descrito nesse caso é o folk horror. Para Adam Scovell, autor do livro Folk Horror: Hours Dreadful and Things Strange, o elemento do folk nas narrativas está ligado com a cultura do próprio gênero de terror que se baseia em folclores como lobisomens, vampiros, múmias amaldiçoadas e uma infinidade de outras coisas invisíveis para contar suas histórias (2017, p. 15). Para Keetley, as definições do horror popular surgiram quase que exclusivamente no contexto do folk horror britânico; logo, o mesmo modelo, em outras tradições nacionais, não se encaixará (2020). Scovell aponta que o nascimento do folk horror britânico está intimamente ligado ao movimento de contracultura durante os anos 1960 e destaca que não existe uma marca definidora do subgênero: cada país tem seu próprio “folk” e assim terá também suas próprias convenções sobre o folk horror (ibidem, p.18 e 24). Dessa forma, é importante reconhecer a escravidão como um dos pilares sobre os quais se construiu a história do país e que será tensionada em alguns filmes dentro do subgênero folk horror brasileiro. Para Clóvis Moura, importante autor e teórico da história negra no Brasil, o povo negro durante e após o processo de escravização passou por um significativo regime de desarticulação do seu mundo religioso através de métodos catequistas e sincréticos (1989, p. 34). Isso se deu porque a cultura portuguesa foi imposta como a única conhecedora do sobrenatural, que poderia, de igual forma, explicar o mundo natural, transformando qualquer cultura adjacente em animista e fetichista – logo, primitivas (ibidem). A vista disso, o autor destaca: “A mesma coisa aconteceu com seus instrumentos rituais, que passaram a ser instrumentos típicos, com suas manifestações musicais, sua música, indumentária africana, a cozinha sagrada dos candomblés. Tudo isso passou a ser simplesmente folclore. E com isso, subalternizou-se o mundo cultural dos africanos e seus descendentes (1989, p. 35)”. O autor ainda destaca que além da demonização das culturas afro, o processo colonizatório brasileiro inclui o apagamento dos saberes de diversos povos da diáspora e a proibição dos seus ritos, do uso das línguas originárias, legando a esses povos a marginalidade na elaboração da cultura nacional (1994, p. 179, 182). Esses conhecimentos e vivências, tradições e interpretação do mundo sensível e visível são trazidos de volta em quatro filmes com sentido horrífico, resgatando o que foi cimentado como folclore agora a partir de premissas de vingança e condenação do período colonial e pós-colonial. Os longa-metragens O nó do diabo (2017, Ramon Porto Mota, Jhésus Tribuzi, Ian Abé, Gabriel Martins), O diabo mora aqui (2015, Dante Vescio, Rodrigo Gasparini) e O Juizo (2019, Andrucha Waddington) recortam o folclore dentro do imaginário escravagista e colonialista, trazendo com eles, os terrores e assombrações de anos passados e da revanche da população negra morta durante – e após - a escravidão. Cada um destes filmes exploram os fantasmas de uma memória dolorosa para punir a todos que foram responsáveis ou que se beneficiaram das atrocidades decorridas dos tempos coloniais. Ademais, o processo de retorno dos fantasmas e de punição se dá no campo místico das casas coloniais, nas quais as próprias casas possuem uma participação ou acolhem os ritos e a presença das entidades. |
|
Bibliografia | CHERRY, Brigid. Horror. New York: Routedge, 2009. |