ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | Conversas em busca de autenticidade: som direto em Muito Prazer (1979) |
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Autor | Gabriel Philippini Ferreira Borges da Silva |
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Resumo Expandido | “Muito Prazer” (1979, dir.: David Neves) é um exemplo raro de “filme conversado brasileiro” nos anos 80. Ao longo do longa-metragem, chama a atenção a maneira como os cineastas priorizam o registro das conversas mais cotidianas e prosaicas entre seus personagens, em detrimento ao desenvolvimento narrativo do filme. A captação da espontaneidade dos atores, dos sotaques, dos trejeitos e da "autenticidade" da cena é o que interessa aos cineastas. “Muito Prazer” é, como contam os relatos de produção, uma ficção filmada segundo técnicas de cinema direto, com filmagens em película 16mm de uma câmera livre e ágil e, particularmente, com a captação de som direto. É pelo interesse por este último que partimos à esta comunicação. Neste trabalho, buscamos explorar a abordagem e captação dos diálogos no filme, analisando uma cena específica à luz dos estudos sobre filmes de conversação de Alexandre Rafael Garcia (2022), dos estudos sobre o diálogo cinematográfico como elemento sonoro de Débora Opolski (2021), das reflexões do próprio crítico-cineasta David Neves em seus textos e de breve panorama acerca do problema do “problema do diálogo cinematográfico” no Brasil (GOMES, 2016). Tendo em vista o interesse por estudar justamente a sonoridade dos diálogos, como ferramenta de análise, utilizamos, entre outras, de análise espectral da cena para compreender como as falas dos personagens são registradas no filme. A análise do espectrograma nos permite examinar a frequência e intensidade dos sons no determinado momento do filme e, desta forma, pode nos ajudar a identificar padrões sonoros do estilo cinematográfico de “Muito Prazer”. Partimos também da análise fílmica da cena e do estudo de entrevistas e diários de gravação do filme deixados por Neves e seus colegas de realização, reunidos em catálogo de mostra (BRITO, FERREIRA, 2015) e livros autorais (NEVES, 1993; NEVES, 2004), e de trabalhos e críticas já realizados sobre "Muito Prazer" para confrontar diretamente o estilo empregado na captação dos diálogos do filme. Considerando a busca de David Neves por uma “almejada autenticidade” (NEVES, 1993, p. 34), sua crença no poder da representação do “Brasil e de sua gente” (NEVES, 2004) por meio da fala em português nos filmes, e tendo ainda em vista os relatos da produção de Muito Prazer deixados tanto pelo roteirista Joaquim Vaz de Carvalho, como pelo produtor Carlos Moletta e pelo diretor de fotografia Jom Tob Azulay, analisamos como a captação dos diálogos dos personagens em som direto, assim como a escrita de falas cotidianas, são empregados na busca por captar a espontaneidade dos “sotaques, dialetos e variações de formas da fala do português brasileiro” (OPOLSKI, 2021, p. 79) e criar uma atmosfera naturalista, “familiar” e “íntima” que aproxima o espectador da experiência vivida pelos personagens. Por fim, destacamos o caráter singular de Muito Prazer como um filme em que as conversas entre os personagens têm destaque principal e não somente acessório à narrativa, compreendendo a inserção de Muito Prazer em um panorama de “filmes falados brasileiros” que ganha corpo após “a introdução dos equipamentos e das técnicas de captura de som direto em locações ao ar livre e a troca de experiências entre cineastas” (GARCIA, 2022, p. 249). E destacamos a importância do som direto na gravação dessas conversas para garantir ao filme o registro da “espontaneidade” dos atores, de seus sotaques” e a tentativa de “impressão de uma realidade” (MAURO, 1932) brasileira que já há tempos vinha sendo buscada no cinema nacional. |
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Bibliografia | GOMES, Paulo Emílio Sales. A ideologia da crítica brasileira e o problema do diálogo cinematográfico. In: GOMES, Paulo Emílio Sales; CALIL, Carlos Augusto (Org.). Uma situação colonial? São Paulo: Companhia das Letras, 2016, p. 115-118. |