ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | Vestido de noiva: A materialidade visual de um projeto de país |
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Autor | Elizabeth Motta Jacob |
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Resumo Expandido | Rosangela da Silva, a Janja, em seu vestido de noiva para o casamento com o então candidato a reeleição à presidência da República Luís Inácio da Silva, é a origem deste trabalho. A escolha deste tema aponta na direção dos pequenos fatos da vida privada e seu grande poder de representação. Considero que a direção de arte atravessa e é atravessada por diversas dramaturgias nas quais vivências e modelos de representatividade se ancoram e são fontes de inspiração. Identifico na profícua narratividade da produção visual da noiva mensagens de caráter político ideológico direcionado aos eleitores. Estas mensagens se estabelecem na ordem de uma materialidade visual própria às questões do campo de investigação da direção de arte e, nosso tema de estudo. Figuras públicas contribuem na formação do imaginário popular sobre a sociedade, suas vidas são afetadas pelas repercussões midiáticas e mercadológicas. Como nos diz Bourdieu (1975), a produção simbólica na vida social está a serviço da legitimação das forças dominantes, cujos gostos, estilos de vida e signos de classe compõem o que vem a ser reconhecido como distinção social e estão diretamente ligados ao capital cultural. Dentre as cerimônias, em nossa sociedade, o casamento tem destaque por trazer para a esfera publica afirmação de laços afetivos e patrimoniais tendo para Bourdieu segundo Woortman (2004), caráter político. É importante considerar o casamento que analisamos sobre este aspecto. Realizado às vésperas da eleição ele fez parte da agenda política e da mensagem de amor que Lula desejava transmitir ao povo brasileiro enfatizando a sua oposição, tanto a nível discursivo quanto da práxis política, com o seu maior adversário no pleito. A cerimônia de casamento se deu em evento privado celebrada pelo bispo Dom Angélico Sândalo. Na cerimônia o noivo trajou um terno azul, camisa social branca sem gravata, flor vermelha na lapela e sapato social. A noiva se apresentou com um vestido assinado por Helô Rocha, bordado à mão pelas bordadeiras de Timbaúba dos Batistas, uma cidade da região do Seridó no sertão do Rio Grande do norte. O vestido tinha decote canoa e um corpete de cintura baixa seguido de uma saia ampla em seda off-white e mangas bufantes. Aparentemente trata-se de um vestido de noiva convencional, de acordo com o que foi definido a partir do século XIX pelo Papa Pio IX, já que branco. No entanto, um olhar apurado percebe singularidades no traje. O primeiro aspecto a ser destacado é o bordado com a flora nordestina bordada no lugar das tradicionais referencias à vegetação européia. Ao escolher cactus e arbustos do nordeste como tema ela presta homenagem ao noivo, oriundo dessa região, e também ao seu maior colégio eleitoral. Trazer a vegetação nordestina em seu corpo é colocar em cena a relevância do Nordeste na pauta política. O restante do bordado evoca uma noite branca e pacífica onde a lua aparece em diferentes fases. Como nas noites do sertão nordestino, podemos ver estrelas de diferentes tamanhos e formatos, dentre todas elas há uma pequenina adereçada com uma pedra vermelha e brilhante aludindo ao símbolo do Partido dos Trabalhadores. A menção feita pelo vestido à singularidade brasileira, não se esgota na valorização do trabalho das bordadeiras, no destaque da vegetação nordestina e nem mesmo no céu risonho e límpido que o país ostenta. A particularidade de nossa cultura aparece ainda na evocação à Iemanjá. Esta fica clara quando comparamos a imagem de Janja portando o vestido e as imagens do orixá. Deste modo, Janja aponta para a pacificação a ser implementada em relação às manifestações das religiões de matrizes africanas tão atacadas durante o governo Bolsonaro. Ao fim do casamento os noivos ofereceram a cada convidado um bordado com a frase o amor venceu. Percebe-se que esta celebração sela o discurso político perfeitamente. Janja fortemente orientada politicamente, utiliza seu figurino de forma expressiva demonstrando o projeto ideológico que representa. |
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Bibliografia | BENJAMIN, W. A modernidade e os modernos, Rio de Janeiro: Editora tempo Brasileiro, 1975. BOURDIEU, Pierre. Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998. |