ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | Memória inventada: Chão de Fábrica e a ficção sobre a ditadura militar |
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Autor | Mônica Mourão Pereira |
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Resumo Expandido | “A radionovela ‘Chão de fábrica - uma história de mulheres’ nunca seria feita. Nas icônicas fotografias da greve de 79 do ABC paulista, quase não vemos mulheres. Nós nunca esqueceremos que estivemos lá”. Essas são as últimas palavras pronunciadas pela personagem-narradora do curta-metragem “Chão de Fábrica” (2021), de Nina Kopko, com roteiro dela e de Tainá Muhringer. Diferente do documentário homônimo de 2018, de Renato Tapajós, o curta conta a história de quatro operárias que mostram a perspectiva das mulheres em relação à histórica greve do ABC, um dos episódios-chave no processo de redemocratização do Brasil. A ideia da radionovela é uma brincadeira criada pelas companheiras de trabalho Joana, Renata, Irene e Miriam, numa das conversas que elas tinham diariamente no banheiro feminino de uma fábrica, enquanto ouviam pelo rádio ou pelas frestas da janela os acontecimentos políticos que se desdobravam lá fora, durante a organização de uma greve “de homem pra homem”, como definiu Miriam. Lá dentro, onde subentende-se estarem as únicas mulheres de toda a fábrica, os modos pessoal e político (PORTELLI, 2010) se misturam nos diálogos das quatro personagens, entremeados por uma viagem ao futuro feita pela narradora, Irene, que sonhava em ser locutora de rádio e brinca com isso desde a ideia das amigas de fazer uma radionovela. “O tempo só se torna tempo humano quando narrado”, já dizia Paul Ricoeur (1994). E, durante essa narração que opera os tempos passado e futuro, Irene conta os desfechos de cada uma das quatro, todos compostos por questões de suas trajetórias pessoais e acontecimentos políticos. Nestes momentos, além de uma trilha sonora não diegética, as personagens encaram, olhos nos olhos, espectadoras e espectadores. Mas o que mais chama atenção na relação entre memória, história e invenção é a fala do fim do filme, que abre este resumo. Após Irene dizer que nunca esquecerão que estiveram na greve de 1979 no ABC Paulista (enquanto ela, Joana e Renata olham para a câmera), as fotografias em preto e branco mencionadas por ela aparecem na tela. Multidões de homens vão, aos poucos, sendo mostrados com menos luz, enquanto os raros rostos de mulheres são iluminados. Este final abre a seguinte possibilidade de interpretação do filme: que a ideia parte do reconhecimento da ausência das mulheres na História da greve, enquanto, mesmo sendo minoria, elas também viveram esta experiência histórica. Já os créditos informam que a inspiração do roteiro foi a peça “O pão e a pedra”, que conta a história de diferentes personagens operários do ABC durante a greve de 1979 a partir de uma personagem mulher que se disfarça de homem para trabalhar numa fábrica e assim receber melhor. Também é informado a quais acervos pertencem as fotografias. Seja primeiramente inspirado na peça ou nas fotografias, o que importa para a análise proposta é que esta é uma ficção que parte da realidade histórica para criar outras histórias e personagens que, sendo invenções, recontam a História. É uma evidente disputa em torno da memória coletiva (HALBWACHS, 2006), com expressões criativas desenvolvidas por empreendedores (JELIN, 2002) que dialogam com as memórias subterrâneas (POLLAK, 1989). Considera-se, neste trabalho, que as operações de memórias feitas por este filme são uma importante maneira de se trabalhar a memória das ditaduras, da redemocratização e da atual democracia no Brasil. |
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Bibliografia | HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Centauro, 2006. |