ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | Respostas do cinema brasileiro recente ao bolsonarismo |
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Autor | Maria Leite Chiaretti |
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Resumo Expandido | Nesta comunicação, discutirei como alguns filmes de ficção brasileiros recentes abordam de maneiras distintas a derrota política representada pela ascensão do bolsonarismo. Partindo de uma breve definição do fenômeno do bolsonarismo (que não se confunde universo dos seus eleitores), informada por estudos recentes, analiso as respostas que ele suscitou no cinema brasileiro mais independente. A constelação de filmes privilegiada aqui se compõe de "A febre" (Maya Da-rin, 2020), "A vida são dois dias" (Leonardo Mouramateus, 2022), "Bacurau" (Kleber Mendonça Filho, 2021), "Mato seco em chamas" (Adirley Queirós e Joana Pimenta, 2022), "Marte Um" (Gabriel Martins, 2022), "Medusa" (Anita Rocha da Silveira, 2023), "República" (Grace Passô, 2020) e "Sete anos em maio" (Affonso Uchôa, 2019). Trata-se de examiná-los como respostas ao período histórico correspondente à ascensão e ao governo da extrema-direita no Brasil. Ao aproximar cineastas de origens geográficas, sociais e raciais diversas, procuro traçar um léxico de soluções formais e temáticas nos filmes para lidar com o passado recente que nos assombrou a todos do espectro democrático e apontar para o futuro próximo. Alguns dos filmes tendem a aderir a certos códigos do cinema de gênero, como "Bacurau", "Marte Um" e "Medusa", enquanto outros propõem ficções que se avizinham do documentário, como "A febre", "A vida são dois dias" e "Mato seco em chamas". Um terceiro grupo tematiza na dramaturgia e no corpo dos protagonistas a violência histórica do país contra a população negra e periférica, como "República" e "Sete anos em maio". As respostas dos filmes lançados entre 2019 e 2023 oscilam entre o drama e a sátira, o que me fez lembrar da introdução de "O que vem depois da farsa?" (2021), em que o crítico e historiador Hal Foster escreve: “Originariamente uma farsa (que deriva do francês farcir, rechear) era um interlúdio cômico numa peça religiosa. Uma farsa pode ser entendida, então, como um momento intermediário, talvez na linha do “interregno mórbido” entre as antigas e as novas ordens políticas”. Foster se pergunta (pensando em Donald Trump): “Como “desdadaizar” um presidente cujo protótipo parece ser o monstro infantil Pai Ubu, de Jarry?”. Para o autor, essa situação extrema provocou formulações igualmente extremas por parte de artistas contemporâneos, e nesse sentido, vejo os filmes elencados acima como respostas do campo da esquerda para a nossa situação política e social. Interessa-me discutir em que medida as narrativas e as imagens produzidas por este grupo de filmes diagnosticam este período histórico, e como elas flagram e eventualmente reinvestem sentimentos coletivos produzidos pelo bolsonarismo, tais como medo, paranoia, ressentimento e vingança, mas agora numa direção política contrária. Realizados nos últimos cinco anos, eles são a um só tempo um resultado tardio de um período de democratização da produção do cinema brasileiro, de acesso à educação superior via política de cotas e de aprofundamento das lutas sociais feministas, negras, indígena e LGBTQIA+ (estimulados pelas políticas públicas dos 13 anos de governo petista), e uma expressão da resistência coletiva aos retrocessos institucionais que o sucederam (lembremos a destruição pelo governo Bolsonaro das políticas públicas de incentivo à realização de filmes, e sua hostilidade notória à universidade pública e àquelas lutas). O horizonte da comunicação é entrever as lições para superação do bolsonarismo presentes nos filmes e os modos de futuro apontados por eles. |
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Bibliografia | DIEGUEZ, Consuelo. O ovo da serpente: Nova direita e bolsonarismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. |