ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | Projeção mapeada: arte performativa e expressão política na Amazônia |
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Autor | Denise Costa Lopes |
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Resumo Expandido | O Festival Amazônia Mapping (FAM), que completou uma década nesse ano de 2023 com exibições on-line em realidade virtual, auxiliou na criação de uma rede de projeção mapeada na região que dá visibilidade a agentes e narrativas invisíveis. A artista Roberta Carvalho, idealizadora do evento e uma das pioneiras na prática em Belém do Pará, realizou durante esses anos experimentações que engendraram experiências sensoriais imersivas e fizeram com que seus interlocutores muitas vezes pudessem ver e sentir como os homens e os bichos que habitam a Amazônia. Os cenários e os modos de operação dessa arte interativa surgidos com o FAM acabaram por dialogar imageticamente, de forma simbólica, com ritos da tradição indígena do xamanismo, que buscam o transe, a transmutação e o contato entre corpos e espíritos de seres míticos da floresta, animais, plantas e mortos, envolvendo ideais de cura. Como escreve Eduardo Viveiros de Castro, “O xamanismo ameríndio pode ser definido como a habilidade manifesta por certos indivíduos de cruzar deliberadamente as barreiras corporais entre espécies e adotar a perspectiva de ‘subjetividades estrangeiras’, de modo a administrar as relações entre estas e os humanos” (2018, p.49). Ao evocar com suas projeções fantasmagóricas rostos em copas de árvores (Symbiosis/2007) que balançam com o vento, alterando fisionomias, ou corpos projetados nos rios (Cinema líquido/2015) que se movem com as ondulações das águas, Roberta não só faz reviver os espíritos da floresta e nos reconectar com a natureza e a herança de nossos antepassados, como materializa de alguma forma a magia desses rituais, impactando um imaginário muito poderoso, adormecido por séculos de descaso, opressão e espoliação. Na criação de suas esculturas de luz, árvores e rios ganham olhos a nos fitar e ouvidos a nos escutar, numa simbiose que faz com que o homem tome literalmente o ponto de vista das árvores, dos rios, da natureza, trazendo a animalidade para o domínio humano, exatamente como nos descreve Castro sobre o perspectivismo ameríndio. Olhar para essas performances tecnológicas criadas com a luz pelo viés desse perspectivismo e multinaturalismo, onde homens, plantas e animais distantes do antropocentrismo, abolem hierarquias ontológicas para viverem em harmonia, com cada espécie irradiando uma consciência, parece ser enriquecedor. A centralidade do corpo como materialidade social trazida pela imaterialidade das imagens projetadas em superfícies em movimento nos remete também ao tema da memória e à ideia das “imagens sobreviventes” apresentadas por Didi-Huberman a partir de Aby Warburg. Os processos de ressignificação histórica, rememoração de processos coloniais e de conscientização tão afeitos às intervenções espaciais das projeções mapeadas estão sempre a trabalhar com deslocamentos, metamorfoses, recalques e desejos de reviver origens perdidas. Symbiosis e Cinema líquido trabalham sobretudo com a ideia de sobrevivência e resistência de formas de vida amalgamadas com a natureza. A força dessas obras vem dessa potencialização de “imagens sobreviventes” do universo amazônico em conexão com a cosmologia ameríndia, e também da materialidade impressa por seus espetáculos de luz em cenários primitivos que exacerbam a visão arqueológica do cinema (Elsaesser), remontando às várias experiências com luz e movimento desde as pinturas experienciadas por meio do fogo nas cavernas do Paleolítico. Ao tentar analisar de forma transmidiática e transhistórica essas práticas do video mapping como arte performativa e expressão política, discutindo a base dos estatutos da imagem em movimento em sintonia com as teorias de Eduardo Viveiros de Castro, o presente trabalho pretende colaborar para o avanço do pensamento sobre a atividade em expansão na Amazônia, bem como para uma maior reflexão acerca dessa potente rede que tem conseguido levar para o mundo, muitas vezes literalmente, a face dessa população originária destituída de suas terras e cultura. |
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Bibliografia | Brandi, M. (2019). A linguagem autônoma da luz como arte performativa. In Bambozzi, L., Portugal, D. (Org). O cinema e seus outros: manifestações expandidas do audiovisual. São Paulo: Equador: AVXLab - Laboratório de Audiovisual Expandido. |