ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | Irrupções do cinema abstrato em narrativas contemporâneas de ficção |
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Autor | Milton do Prado Franco Neto |
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Resumo Expandido | A proposta deste trabalho é de repensar a aparição do cinema experimental abstrato dentro de obras de ficção atuais, identificando os modos em que se esta se dá: como empréstimo, apropriação, citação ou irrupção. Muitos dos cineastas de vanguarda vinculados à vertente mais gráfica nunca deixaram de se aproximar e contribuir com o cinema de ficção. Oskar Fischinger, por exemplo, foi um dos responsáveis pelos efeitos especiais de Mulheres na Lua (1929), de Fritz Lang, e trabalhou nos estúdios Disney. As pinturas animadas (para usarmos uma expressão desabonadora usada por DEREN, 2012) de Fischinger encontrarão, de certa forma, continuidade nos trabalhos de Len Lye e Norman Maclaren. É com a chegada da geração de cinema experimental americano inaugurada por Deren que surge a ideia de um cinema anti-hollywoodiano. Isso vai se dar tanto por textos quanto pela radicalização de procedimentos anti-ilusionistas que rejeitam a representação e a narrativa tradicionais, em um primeiro momento, e a figuratividade, em um segundo. Jordan Belson, Harry Smith e, em especial, Stan Brakhage, são os responsáveis por criar muito do que hoje se conhece por cinema abstrato norte-americano, em uma abordagem romântica, muitas vezes espiritual e mesmo esotérica. Este cinema abstrato associa-se eventualmente ao espírito de contracultura e psicodelia da época, reivindicando a pureza de sensações só atingida por uma outra imagem que somente este tipo de cinema forneceria: “Imagine um olho não governado pelas leis fabricadas da perspectiva, um olho livre dos preconceitos da lógica da composição […]” (BRAKHAGE, 1993). Alguns realizadores de ficção com status de auteur dentro da indústria, como Stanley Kubrick e Terrence Malick, acessam diretamente obras experimentais para compor sequências de seus filmes, seja por encomenda ou imitação. Em ambos os casos, o cinema abstrato serve, dentro de uma narrativa mais ou menos aberta, para sugerir um parêntese não-figurativo que inevitavelmente carrega em si um significado narrativo-figurativo. Deste modo, em 2001 – Uma Odisseia no Espaço (1969), temos a viagem espaço-temporal na velocidade da luz, e em A Árvore da Vida (2011) é a criação do universo que é aludida. Independente dos resultados, o fato é que cinema abstrato é usado para mostrar o que não pode ser visto, em um tipo de apropriação por empréstimo que encaixa uma finalidade narrativa. Nos últimos anos, porém, podemos perceber uma nova modalidade de aparição do cinema abstrato dentro de narrativas de ficção. Em Twin Peaks – O Retorno (2017), a explosão da bomba atômica permite a irrupção de vários minutos de abstração que remetem diretamente à obra de Brakhage e Belson. A princípio, a estratégia de David Lynch lembra as de Kubrick e Malick: há uma “justificativa” narrativa para aquele momento. No entanto, a dilatação temporal e as indeterminações poéticas que se seguem parecem fazer da sequência um caso raro no formato (série) e na mídia (televisão), que nos incita a pensar em outro tipo de acesso ao imaginário abstrato de vanguarda. De forma diferente, mas igualmente significativa, podemos citar o caso do filme argentino La Flor (2018), de Mariano Llinás. Muito já se falou como esta empreitada de quase 14 horas de duração, com seus diferentes episódios, aposta na ficção sem fim para, a partir de determinado momento, expor a própria crise da narrativa. É preciso notar, também, em como a imagem de La Flor flerta com abstração em seus últimos episódios, em uma espécie de exposição da crise da figuração. Tanto em Lynch quanto em Llinás, o acesso ao cinema experimental parece não ser instrumental, mas integrar campos de ação que BRENEZ (2009) identifica como próprios da vanguarda, como a interrogação do dispositivo e a investigação de imagens passadas e presentes, além do trabalho com a longa duração para questionar os formatos e os meios. |
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Bibliografia | BELLOUR, Raymond. Entre-imagens: foto, cinema, vídeo. Campinas: Papirus, 1997 |