ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | O estatuto do heteropessimismo na cultura pop contemporânea |
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Autor | Thalita Cruz Bastos |
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Resumo Expandido | Toda mulher hetero cis já passou por situações de descontentamento com a heterossexualidade e se viu atravessada pelo questionamento: por que permanecer vinculada a heterossexualidade se ela claramente é uma das suas principais fontes de sofrimento? Dentro do contexto dos estudos de gênero e queer existem subdivisões que buscam endereçar não apenas as dissidências, mas aquilo que a sociedade ocidental tradicionalmente lê como norma. Olhar para a heterossexualidade de forma crítica é reproduzir o movimento dos estudos da branquitude e das masculinidades, ou seja, colocar sob a lente analítica um conjunto de comportamentos e práticas sócio-culturais. A cultura pop audiovisual é o principal palco em que esses valores - patriarcais, racistas e colonialistas – se encontram para performar comportamentos, visões de mundo, angústias, viradas epistemológicas, normas e as próprias alternativas a essas normas. Relutâncias e resistências. Também dissidências. Obras da cultura pop como a série britânica Fleabag (2016-2019), a aclamada série The White Lotus (2021-2022), a adaptação Cenas de um Casamento, de Ingmar Bergman para uma série em 2021, e filmes como Promising Young Woman (2021) e Histórias de um Casamento (2019) trazem para o centro do debate não apenas as relações heterossexuais, mas os meandros dessas relações, os conflitos no contexto contemporâneo a partir das mudanças produzidas pela disseminação dos estudos queer e das terceira e quarta ondas do feminismo. Estou falando do paradoxo da misoginia, da tragédia da heterossexualidade (Jane Ward, 2020), da masculinidade hegemônica (Connel e Messerschmidt, 2013) e do heteropessimismo (Seresin, 2019). A reflexão proposta por esse artigo se localiza na intercessão entre os campos de Estudos Críticos da Heterossexualidade, os Estudos Queer e os Estudos de Cinema e Audiovisual. É um exercício de olhar, a partir da cultura pop audiovisual, para as respostas produzidas sobre à crise da heterossexualidade e aos arroubos de sobrevivência de uma masculinidade hegemônica, tóxica, sexista e patriarcal. A heteronormatividade subjuga não apenas as identidades queer, como também as identidades heterossexuais. Nas performances do feminino, há uma "feminilidade enfatizada" (CONNELL e MESSERSCHMIDT, 2013), ou seja, um feminino que será o par dualista da masculinidade hegemônica. A masculinidade hegemônica, por sua vez, irá dizer da forma como os homens se posicionam através de práticas discursivas. É construída no discurso e performada nas práticas não-discursivas. A partir das obras audiovisuais citadas neste texto, busca-se apontar as ambiguidades do discurso heteropessimista. Seria um processo de desidentificação com a heterossexualidade vivenciado majoritariamente por mulheres, que expressam para seus amigues queer sua insatisfação e seu desejo de sentir desejo pelo mesmo sexo, de serem lésbicas. Entretanto, a acomodação com o lugar seguro da heterossexualidade na sociedade patriarcal capitalista contemporânea é maior que o incômodo provocado por essa existência hétero. O heteropessimismo feminino se revela como um caminho cuja saída é se abrir para fora do universo heterossexual, algo que não é considerado pela maioria das mulheres, pois o desejo de pertencimento e o desejo pela própria heterossexualidade é maior que o descontentamento. Tais configurações sinalizam para um questionamento constante e cada vez mais frequente sobre as diferentes performances da heterossexualidade e seus padrões. Como eles precisam ser pensados, problematizados não apenas por pessoas queer, mas pelos próprios heterossexuais. Essa reflexão, dentro do contexto dos estudos queer, é importante não apenas para desmistificar a aura de normalidade que historicamente ronda a heterossexualidade, mas também para pensar outras formas de existências hétero, não normativas, não hegemônicas. Arranjos que crescem em meio às fissuras da sociedade heteropatriarcal. |
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Bibliografia | BLANK, Hanne. Straight: The surprisingly short history of heterosexuality. Beacon Press, 2012. |