ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | Ocupar imagens: rememorações no cinema experimental latino-americano |
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Autor | Marina da Costa Campos |
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Resumo Expandido | Este trabalho nasce da observação de uma recorrente preocupação de uma parcela das produções contemporâneas do cinema experimental latino-americano em rememorar e explicitar distintas cicatrizes do processo histórico do território, a partir de ferramentas estéticas específicas que se aportam na potência material da imagem fílmica. Tal interesse desse tipo de produção já foi identificada pelos autores Jesse Lerner e Luciano Piazza no livro Ismo, Ismo, Ismo: Cine experimental en América Latina (California: University of California Press, 2017), no qual Lerner aponta a prática do cinema experimental de apropriação, ou found footage , na região como um processo latino-americano de realização cinematográfica antropofágica pouco investigado. Além disso, destaca seu movimento “como um paradigma de uma prática cinematográfica crítica, senão também uma estratégia maior de descolonização e como um modelo contundente para a produção cultural latino-americana” . Para o autor, a utilização de fragmentos arrancados de seus contextos originais para serem reutilizados para outros fins formais, ideológicos, comunicacionais e históricos é “um gesto anticolonial de apropriação e ressignificação, uma forma de criar um “original” mediante a reprodução, o ilegítimo, o emprestado ou o roubado” . Ao analisar esta prática na América Latina, Lerner pincela alguns exemplos de uma relevante produção invisível aos olhos de uma historiografia do found footage mundial como o caso das realizações cubanas que, a partir de material de arquivos, tratam de maneira crítica a revolução ocorrida no país, assim como as pressões políticas, econômicas e sociais exercidas pelos Estados Unidos: curtas de Santiago Álvarez (sobretudo Now, 1965), Un año de libertad (1960) de Julio García Espinosa, e Coffea Arábiga (1968) e Desde la Havana, ¡1969! Recordar (1969), de Nicolás Guillén Landrián. Esses são alguns de muitos outros exemplos espalhados pelo bloco, como os filmes de Claudio Caldini na Argentina com Através de las ruinas (1982), Jorge Honik com Komik (1969); Poli Marichal, de Porto Rico, com Blues tropical (1982); e o Grupo Chaski no Peru com Miss Universo em el Perú (1982), que se aportam na fragmentação e na recompilação de arquivos para questionar o legado de guerras, conflitos e a realidade violenta de cada território. O interesse por este enquadramento específico das leituras históricas da produção experimental continuou presente, desta vez, na forma de uma curadoria de uma mostra de filmes experimentais latino-americanos para Alchemy Film and Moving Image Festival, em Hawik, Escócia, em maio de 2022. A seleção realizada por Natália Barrenha e por mim, intitulada “Reframing the Archive: Reminscences, resistances, re-existences” apresentou um programa de oito filmes contemporâneos do Chile, México, Peru, Paraguai, Brasil, Argentina e Panamá cujo elo comum foi o olhar para as tensões do passado como o colonialismo, a ditadura militar, a escravização da população negra; a extinção de povos originários e a violência de Estado, a partir de um discurso visual baseado no found footage. A pesquisa curatorial dos filmes experimentais latino-americanos nos permitiu identificar uma recorrência crescente deste tipo de abordagem, revelando tentativas de ressignificação deste passado e destacando linhas de continuidade e ressonâncias históricas. É nesta perspectiva de continuidade das pesquisas curadorias que este trabalho pretende caminhar, ao analisar a produção dos seguintes curtas-metragens: Apynayek (Ana Vaz, Brasil, 2020), Familiar (Paz Encina, Paraguay, 2014), Las mujeres de Pinochet (Eduardo Menz, Chile, 2005) e Materia oscura (Bruno Varela, México, 2016) objetivando compreender em que medida esta estratégia do found footage, assim como das intervenções estéticas nas películas e no digital, se constituem como uma forma de interpretar e escrever fraturas da nossa história, assim como de imprimir novos significados para o nosso percurso histórico latino-americano. |
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Bibliografia | ELENA, A. Una estética del collage: documental, ensayo y vanguardia. In: VAQUERO, L. G.; LÓPEZ, S. G. (Org.). Piedra, papel y tijera: el collage en el cine documental. Madri: Ocho y medio libros de cine, 2009. |