ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | O xadrez do horror: estratégias de intensificação do medo |
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Autor | Paulo Souza dos Santos Junior |
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Resumo Expandido | Herdeiro de uma tradição secular, o gênero de horror é um dos mais explorados na narrativa humana, e no cinema não é diferente. A exploração desse gênero cinematográfico é vasta e diversa, com uma variedade narrativa e formal que ainda hoje rende interessantes demonstrações de originalidade e reinvenção. No entanto, essa tradição secular desencadeia um efeito curioso: o espectador cativo de cinema de horror acaba por conhecer as estratégias formais e narrativas que sustentam o gênero. Essa apropriação por parte das plateias terminou por domesticar o principal afeto do gênero, o medo. Se as estratégias da instância criadora já são conhecidas, um espectador versado no horror pouco se afetará pelos desdobramentos que ele é capaz de antecipar com certa facilidade. Tuan (2005, p. 8) aponta que o medo é "uma emoção que indica perigo e é necessária para a sobrevivência" humana. No campo da arte, no entanto, é proposto enquanto experiência estética em uma condição paradoxal de desejável/indesejável. Como discute Noel Carroll (1999), embora as pessoas procurem filmes de terror para sentir medo e experimentar emoções fortes, elas também tentam evitá-los e escapar das emoções desagradáveis que o horror pode trazer. Aqui buscamos nos afastar da proposição de atmosfera ou sensorialidade para compreender a persistência do efeito do horror a partir da criação ou repaginação de efeitos formais e narrativos, operando em um nível cognitivo que conta com a existência de um espectador versado em narrativas fantásticas e nos estratagemas do autor de horror. Aqui, o autor, gozando de plena consciência da condição do espectador, propõe um jogo mental: causar medo em quem já está consciente e, em tese, apto a evitá-lo. Nos interessa investigar, reformando a expressão de Elsaesser (2015, p. 46), uma insegurança cognitiva, produto do reconhecimento de padrões narrativos e estilísticos que marcaram suas experiências prévias com o gênero. Para além das considerações atmosféricas, como a escuridão ou o desconhecido, buscamos investigar a influência do somatório de prévias vivências do espectador, o reconhecimento de perigos e a iminência da sensação de medo na experiência de recepção. Se a preparação para um susto, coreografada pela junção de montagem, movimentos de câmera e trilha sonora, é rapidamente reconhecida e, em grande medida, neutralizada, como impactar o espectador versado nas estratégias do gênero? Como intensificar a experiência do horror diante de uma audiência imune aos corriqueiros artifícios de construção do medo? Observamos que é recorrente o esforço em gerar repaginações, romper com os padrões e oferecer novas respostas aos problemas já conhecidos. Cada movimento do filme é direcionado ao seu interlocutor, que o recebe com uma leitura crítica e analítica. Enquanto o espectador reconhece os padrões e antecipa os movimentos da narrativa, a obra agora se esforça em mascarar suas intenções e ações, em um jogo intelectual em que desestabilizar o interlocutor é o grande objetivo. Ao se desviar do fluxo convencional das narrativas já assimiladas, tais obras geram uma fissura na autodefesa do espectador e, com isso, criam condições para imprimir com ênfase o horror. Em geral, essa criação de medo opera na desmontagem das defesas do espectador. Isso pode ocorrer por meio de estratégias como: a dilatação demasiada do momento de tensão, a ponto de se perder a referência da iminência do perigo; pela descaracterização das ameaças, como ocorre no uso de falsos jump scares; pela construção narrativa de um pacto moral entre espectador e obra, a partir do não uso indiscriminado de sustos; entre outras vias que buscaremos discutir no decorrer do texto. |
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Bibliografia | CARROLL, Noël. A Filosofia do Horror ou Paradoxos do Coração. Campinas: Papirus, 1999. |