ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | O motivo da cortina no ciclo trágico de James Gray |
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Autor | Pedro de Andrade Lima Faissol |
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Resumo Expandido | No âmbito doméstico, a cortina é um elemento decorativo banal. Está presente em grande parte dos lares, emoldurando janelas e separando cômodos. É usada também em espetáculos teatrais, salas de aula, ao redor de leitos hospitalares e até mesmo no interior de igrejas, delimitando a entrada na capela ou no confessionário. Estão presentes em toda parte. No cinema, embora sejam igualmente recorrentes, elas nem sempre são filmadas inocentemente. A cortina por vezes desempenha nos filmes um papel marcado pela ligação com o teatro. Alain Resnais, Manoel de Oliveira, Jacques Rivette, entre outros, fizeram usos instigantes da cortina como forma de explicitar os códigos teatrais, assumindo o artifício e definindo o regime de encenação. De outro lado, Rita Azevedo Gomes, Júlio Bressane, Éric Rohmer, Christian Petzold – a lista continua – fizeram usos da cortina como forma de indicar um jogo entre os personagens, um faz-de-contas no interior da diegese. Nesses dois casos, o teatro é evocado no sentido de reestabelecer um pacto ficcional com o público, atuando em seu sistema de crenças. A cortina, afinal, anuncia um outro mundo. Um mundo demarcado, enclausurado, regido por regras especiais. Um jogo? Um palco? Artifícios, simulações? Mas a cortina é também usada com propósitos diferentes. Por exemplo, como figuração de uma fronteira, um limiar. Na presente comunicação, iremos analisar a forma como o diretor e roteirista estadunidense James Gray faz uso da cortina em seus quatro primeiros filmes: Fuga para Odessa (Little Odessa, 1994), Caminho sem volta (The Yards, 2000), Os donos da noite (We own the night, 2007) e Amantes (Two lovers, 2008). Supõe-se que a análise detida do motivo recorrente da cortina nos ajude a compreender como a estrutura dramática de tais filmes se organiza de acordo com um padrão narrativo próprio do gênero da tragédia. Em tais filmes, as cortinas desempenham um papel importante, demarcando a fronteira que separa dois espaços irreconciliáveis: de um lado, a possibilidade ilusória de viver de acordo com o seu desejo, colocando em prática a liberdade individual pelo exercício do livre-arbítrio; de outro lado, o peso da tradição (religião, etnia, moral) se impondo pela primazia dos desígnios que regem o destino dos personagens. A dualidade acima descrita se manifesta nos quatro filmes supracitados. No “ciclo trágico” de James Gray, o peso da tradição familiar sempre se impõe sobre as escolhas ilusórias do indivíduo, mostrando-se no fim das contas mais impotente do que nos parecia no início de cada filme. O peso desta tradição, implacável, é reforçado por personagens imigrantes que carregam um lastro cultural pesado demais para ser superado. Ao longo da comunicação, iremos expor as noções de trágico e de “páthos trágico”, tais como defendidos pelos autores que subsidiam esta pesquisa, sendo os principais: Peter Szondi (Ensaio sobre o trágico), Raymond Williams (Tragédia moderna) e George Steiner (A morte da tragédia). Em seguida, iremos mostrar como as estruturas dramáticas de cada filme analisado dependem de elementos visuais (as cortinas, em especial) que reforcem e cristalizem os impasses vividos pelos personagens. A análise fílmica revela soluções inteligentes e inventivas. Em Fuga para Odessa (1994), a cortina é o suporte sobre o qual será lançado o tiro de revólver, ecoando a dimensão premonitória que selará o destino trágico do protagonista. Em Caminho sem volta (2000) e Os donos da noite (2007), ela é trabalhada como figuração de um limiar que demarcará a passagem entre dois espaços irreconciliáveis: a legalidade e a ilegalidade, o público e o privado, os vínculos familiares e não-familiares. Por fim, em Amantes (2008), a cortina instaura um jogo no interior da diegese que condensará as tensões (entre a livre-escolha e a predestinação) vividas pelo protagonista. |
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Bibliografia | DEMARCY, Richard. “A leitura transversal”. In: GUINSBURG, Jacó (Org.). Semiologia do teatro. São Paulo: Perspectiva, 1988. |