ISBN: 978-65-86495-06-5
Título | A heterocuiridade abjeta em Close, de Lukas Dhont |
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Autor | Fernando Mascarello |
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Resumo Expandido | A temática central de Close (2022), do cineasta belga Lukas Dhont, gira em torno ao apaixonado amor fraterno entre dois meninos púberes, Léo e Rémy, e a repressão social e psíquica, de cunho heteronormativizante, a essa espécie amor, mesmo que não sexualizado, entre rapazes na entrada da adolescência. Em seu terço inicial, a obra retrata idilicamente esse amor fraterno, quando acompanha as suas férias de verão na região rural onde vivem. O restante do filme examina essa dupla repressão (social e psíquica), experimentada incisivamente a partir da entrada dos meninos no ensino médio,, além das suas trágicas consequências, efeito de suas escolhas psíquicas e existenciais bastante distintas. Na recepção de Close, um dos pontos debatidos foi o eventual destino desse amor fraterno, incluindo sua possível sexualização, caso não tivesse houvesse sido subitamente interrompido - e também as possibilidades, a isso enlaçadas, de escolha adulta de orientação sexual dos dois rapaze. Deixando essa questão em suspenso, proponho uma aproximação a essa forte amizade partindo da posição mais afirmativa (e psiquicamente mais consciente,) pelos dois personagens, de enfrentamento à ação homofóbica dos novos colegas, os quais denunciam um suposto caráter sexualizado - e logo, eroticamente homossexual - em seu amor fraterno. O objetivo principal da pesquisa, então, é investigar a figuração, no filme, dos mecanismos políticos e discursivos da repressão social exercida e as repercussões, notavelmente distintas, sobre o psiquismo e o comportamento de cada um dos protagonistas. Uma primeira e essencial fonte teórica que utilizo é a formulação conceitual da homofobia por Eve Sedgwick (1985), a qula mostra como a homofobia, a partir da modernidade europeia, passa a ser empregada para a dominação não apenas de uma minoria homossexual oprimida, mas da totalidade dos homens. Close investiga de uma maneira crua e poucas vezes vista como a ferramenta que Sedgwick designa como “pânico homossexual” serve para chantagear, via terrorismo psíquico, os homens que se identificam como héteros, com fins de delimitar, de forma muito mais nítida que para as mulheres, os limites toleráveis, para o regramento heteronormativo patriarcal, das manifestações de homoafetividade entre homens. É interessante comparar o Close de Lukas Dhont, por outro lado, com o chamado “bromance" - o discurso e gênero audiovisual e literário que vem-se sedimentando ao longo dos últimos 30 anos. Este geralmente se caracteriza, de acordo como diversos autores (ver, p. ex., a coletânea organizada por Michael DeAngelis [2014]), pela decidida ambiguidade vista em sua simultânea afirmação e negação de seu próprio objeto, o "romance" entre homens héteros. Mas, ao mesmo tempo, por conta de sua cada vez mais aberta encenação de desejos e relações homossociais que testam os limites históricos da normatividade heterossexual, o bromance apresentaria também, segundo vários teóricos, um caráter político dissidente ou heterodoxo de relevância política e cultural - muito embora tantos outros nele identifiquem, em lugar disso, um instrumento de conservadorismo cultural masculinista e patriarcal. Tendo esse quadro do bromance em mente, quero crer que Close adentra na exploração de um território habitado por aquilo que, em termos de intensidade dos vínculos afetivos homossociais entre homens, segue inaceitável ainda hoje nos limites mesmo das sociedades mais liberais encontradas no Ocidente, e, por conseguinte, dentro dos limites do próprio bromance. Não à toa, aliás, suas manifestações como gênero audiovisual costumam se dar no universo da produção e consumo de perfil clássico ou hollywoodiano, e não no terreno do cinema de arte onde se radica a estética realista de Close. A fim de explorar analiticamente o amor fraterno como figurado em Close, parece-me necessário, em razão disso, compreender como a intensidade de seus afetos permanece em uma condição socialmente marginalizada como “abjeta”, segundo a céleb |
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Bibliografia | BUTLER, Judith. Problemas de gênero - Feminismo e subversão de identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003 (1990). |