ISBN: 978-65-86495-09-6
Título | Quando o invisível faz vibrar as imagens |
|
Autor | Leonardo Mont'Alverne Câmara |
|
Resumo Expandido | Este trabalho trata sobre a experiência que tivemos com a realização de três Retratos Audiovisuais com mestres e mestras da cultura dos povos Pitaguary, Jenipapo-Kanindé e Kanindé de Aratuba, no Ceará. Esses trabalhos foram desenvolvidos com estudantes de uma disciplina de realização em documentário do Curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Ceará, como parte do projeto “Políticas da terra – encontros da universidade com os saberes e fazeres afro-indígenas”, coordenado pela Universidade Federal de Minas Gerais, e que conta também com a participação da Universidade Federal do Sul da Bahia. Sobre esse processo, tomamos duas questões relativas aos momentos em que o fazer documentário foi pautado pelo que chamamos, provisoriamente, de (1) forças invisíveis que atuam diretamente na composição dos retratos audiovisuais e (2) das práticas audiovisuais enquanto processos pedagógicos. A rede constituída entre as universidades e os saberes tradicionais se mostrou, em nossa experiência, um exercício de escuta e diálogo que se fez presente muito fortemente no modo de lidar com as práticas de formação audiovisual. Acostumados aos modos do fazer audiovisual hierarquizados, onde alguém dirige, outros produzem, outros mais fotografam, e montam etc., enfrentamos os primeiros embates. As equipes deveriam ser compostas no processo de trabalho onde a criação metodológica deveria instituir um processo dialógico, baseada no exercício da escuta. Tal como se explicitou na proposição dos Retratos Audiovisuais, era preciso que todes nós estivéssemos conscientes de que as práticas audiovisuais deveriam ser aliadas aos processos contracolonizadores que envolve os modos de vida e as atuações políticas dos mestres e mestras na defesa de seus territórios. Efetivamente, o diálogo com as mestres e mestras indígenas exigiu a reconfiguração das práticas do ensino da área, que se assentam nas regras de mercado, da divisão do trabalho hierarquizado, colocando em xeque o papel de toda equipe, os seus saberes e as rotinas de trabalho. Tudo isso produz uma experiência de troca e de construção de conhecimentos e de metodologias matizados por saberes e enfrentamentos específicos. Era esse modelo que já se inscrevia desde a construção do projeto “Políticas da terra – encontros da universidade com os saberes e fazeres afro-indígenas”. O que vimos nesse processo de realização dos Retratos Audiovisuais nos permite afirmar que não apenas as universidades brasileiras precisam enfrentar o desafio da contracolonização, o modelo eurocêntrico e monoepistêmico que pautam as formas de produção de conhecimento experimentadas nos territórios acadêmicos. É preciso que as suas práticas, que as práticas de realização audiovisuais superem o modelo neoliberal da produção de saber. Neste artigo, tentamos descrever os embates éticos e estéticos que se deram em um processo de formação audiovisual cujo desejo se firmou na tentativa de engendrar o encontro e a afetação entre saberes acadêmicos produzidos na universidade e conhecimentos vinculados a territórios tradicionais guardados e transmitidos por mestres e mestras da cultura. Ao longo da disciplina, refletir junto aos alunos sobre como o fazer documental poderia se desviar de certos processos de realização em que o cinema opera como uma centralidade diante dos sujeitos filmados para ser experimentado enquanto uma tecnologia de escuta, de encontro e de criação compartilhada. Assim, nos deslocamos aos territórios dos mestres e mestras menos com o interesse de guiá-los em mise-en-scènes construídas anteriormente e mais com o desejo de sermos guiados pelos espaços, trilhas, sons, ritmos, histórias que eles gostariam de compartilhar conosco e com as imagens, abrindo-nos para a presença do acaso e do inefável e acolhendo-as como forças vivas constituintes do processo de criação. |
|
Bibliografia | ALVARENGA, Clarisse (org.). Aprender com imagens: práticas audiovisuais em escolas da Região |